quinta-feira, 10 de junho de 2010

Seminário Particular

Conheci hoje uma dor em mim que não imaginava guardar no peito. Dor essa que me fez saltar da cama e sacudir a poeira impregnada neste blog.
Hoje me senti pela primeira vez como um gay. Senti-me desamparado frente a algumas palavras de insulto que não são um insulto. Mas a raiva estampada nelas transformaria as mais belas palavras em dor. Em dor alheia. Nessa dor de agora.
Preparava-me para um seminário sobre homofobia -  vejam só – e por alguma razão eu me sentia incansavelmente despreparado, mesmo tendo o assunto em mãos. Uma das minhas preocupações era transformar a minha fala em um desabafo. Não queria isso, não podia fazer isso, não era o meu papel.  Devia me concentrar nos dados fundamentados; nas estatísticas cientificamente provadas.  Mas não deu, Professora.
Enquanto ensaiava junto aos meus amigos o teatro dos seminários, uma colega papeava na roda dos atores inseguros. Primeiro um pedido amigável proferido pela boca ao lado:  silêncio, por favor. Até que a insistência da moça me tirou um cala boca da garganta. À nossa relação já competia certas intimidades. Um cala boca era comum entre nós e o meu não carregava raiva mesmo nervoso na coxia prestes a estrear mais um espetáculo, no qual o personagem ainda era um enigma.
A moça virou os olhos pra mim e como se soletrasse para que eu entendesse bem a mensagem proferiu: CALA A BOCA VOCÊ, VEADO!
Seus olhos esbugalhavam aversão.
Fiquei calado, sentido a dor do olhar. SÍ-LA-BA  POR SÍ-LA-BA.  Uma amiga ao lado retrucou, acho que com os ideais do assunto estudado ainda na cabeça: preconceituosa.
“Sou mesmo" - e olhando no meu olho, como quem revela angústias passadas, ela continuou - "Sabia não?”
Da minha dor no peito, saíram também palavras: MALAMADA!
Da sua raiva continuaram a sair: "Sou Mulher, muito mais fácil de ser amada! Diferente de você!"
Agora reescrevendo o ocorrido percebo quão enganada está essa garota.  Os meu amores são incríveis. Só eu sei dos amores que sinto, da mesma forma que só eu sei das dores também.
“Você é opaca. Você foi opaca.”
O resultado. Eu não consegui, Professora. Apenas fundamentei os dados estudados em uma confissão.  Uma confissão minha, particular, dolorida.  O teórico ali era eu. Não apresentei um trabalho, eu me apresentei. A preocupação por força do peito se concretizou. O ator deixou o personagem escapar e ficou nu quando deveria estar vestido.
Professora, me desculpe.

4 comentários:

Ana Helena disse...

Você é um lindo.

Lia Araújo disse...

Muito difícil se desnudar completamente, isso mostra sua força de caráter e incrível sensibilidade!
Mas, sobre a sensibilidade eu já sabia, te vi algumas vezes em cena! A gente adivinha de ver uma pessoa com o coração tão grande!
Muito legal, vc espanar a poeira do blog de vez enquanto!


Bjos

Lia Araújo disse...

Ah, esqueci
Parabéns pelo prêmio do intercom! ;]

Anne Nascimento disse...

Fiquei meu chocada, e meio orgulhosa. Quisera eu ter coragem de me apresentar dessa forma